quinta-feira, 31 de maio de 2012

Nascentes ameaçadas de extinção


Um dos aspectos frustrantes da medida provisória editada pela presidente Dilma Rousseff, de forma casada com vetos pontuais ao Código Florestal aprovado pelo Congresso, é a redução das exigências legais para a recuperação de nascentes.
O comentário é de Márcio Santilli em artigo no sítio do Institudo Socioambiental – ISA, 30-05-2012.

Eis o artigo.

Os legisladores do Planalto introduziram deliberadamente no texto da medida a expressão “perenes”, com o intuito de excluir dessas exigências as nascentes intermitentes que, frequentemente, ocorrem em regiões com menor disponibilidade anual de água.

Diante da reação de espanto com a introdução, por moto próprio do Planalto, de mais um retrocesso na legislação florestal, circulam rumores em Brasília de que a ANA (Agência Nacional de Águas) será convocada a publicar uma nota técnica sustentando que “intermitente” também é “perene”, de modo a evitar uma reedição da medida provisória pela presidente.

Além disso, a medida provisória também consolida a redução da extensão das áreas a serem reflorestadas ao redor das nascentes. Enquanto a lei revogada na segunda-feira indicava um raio de 50 metros ao redor de qualquer nascente, a nova lei mantém esta metragem apenas para as nascentes já protegidas, não desmatadas. Para fins de recuperação, a exigência máxima passa a ser de 15 metros, chegando a apenas 5 metros para as propriedades de menor extensão.

Observa-se aqui a mesma lógica perversa aplicada a vários outros dispositivos do texto legal: quem cumpriu a lei revogada será punido com a manutenção do mesmo nível de exigência e com um conceito de nascente amplo; os que descumpriram a lei – desmatando, aterrando e reduzindo a disponibilidade de água – serão premiados com uma anistia que começa com a introdução do adjetivo “perene” ao conceito e por uma anistia florestal, para fins de recuperação, que variará de 70% a 90%, supondo-se a manutenção de mais essa excrescência na legislação.

Ninguém, em sã consciência, acredita que os órgãos ambientais locais se darão ao trabalho de aferir tecnicamente quais são as nascentes intermitentes e as perenes na sua área de jurisdição. Ou que sairão demarcando círculos de vários tamanhos, de acordo com as extensões das propriedades privadas constantes das matrículas de cada cartório. A própria lei, ao introduzir diferenciações que multiplicam por mil as dificuldades de monitoramento e controle ambiental, induz ao nivelamento por baixo.

É este o sentido da palavra “consolidação”, tão presente na retórica ruralista durante todo o processo de revisão do Código Florestal. Ele significa, na verdade: “fica legalizado o que foi destruído”. Já a responsabilidade de preservar alguma coisa do ativo florestal existente em áreas privadas fica para os “otários” que cumpriram a lei e, agora, verão suas propriedades desvalorizadas em relação às de quaisquer vizinhos predadores.

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