segunda-feira, 30 de abril de 2012

Brasil faz uso descontrolado de agrotóxicos

O uso excessivo de agrotóxicos nas lavouras brasileiras preocupa cada vez mais os especialistas da área de saúde. A aplicação de substâncias químicas para controlar pragas nas plantações e aumentar a produtividade da terra acaba se tornando um problema para os trabalhadores rurais e consumidores.

Para alertar a população e chamar a atenção das autoridades sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde dos brasileiros, o Grupo de Trabalho de Saúde e Ambiente, da Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco), em parceria com outras instituições, lançou nesta sexta-feira (27/04), durante o Congresso Mundial de Nutrição, no Rio de Janeiro, um dossiê reunindo diversos estudos sobre o tema. O documento também será apresentado durante a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que será realizada em junho no Rio.

De acordo com o professor Fernando Ferreira Carneiro, chefe do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB) e um dos responsáveis pelo dossiê, as pesquisas indicam que o uso dos agrotóxicos ocorre no país de forma descontrolada.

“O Brasil reforça o papel de maior consumidor mundial de agrotóxicos e nós, que fazemos pesquisas relacionadas ao tema, vemos que o movimento político é para liberalizar o uso. A ideia desse dossiê é alertar a sociedade sobre os impactos do consumo massivo, sistematizando o que já existe de conhecimento científico acumulado”, disse.

Um dos estudos que fazem parte do dossiê foi desenvolvido pelo médico e doutor em toxicologia da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Vanderlei Pignatti. Ele conduziu análises ambientais e examinou a urina e o sangue de professores e moradores das áreas rurais e urbanas das cidades de Lucas do Rio Verde e Campo Verde, em Mato Grosso. Os municípios estão entre os principais produtores de grãos do estado.

“Observamos resíduos de vários tipos de agrotóxicos na água consumida pelos alunos e pelos professores, na chuva, no ar e até em animais. Além disso, essas substâncias foram encontradas no sangue e na urina dessas pessoas. A poluição ambiental é elevada e as pessoas ficam ainda mais suscetíveis à contaminação porque não são respeitados os limites legais para pulverização dos agrotóxicos, que são de 500 metros no caso de pulverização aérea e de 300 metros para a pulverização terrestre”, explicou.

Outro estudo do professor Pignatti já havia encontrado resíduos de agrotóxicos no leite materno de moradoras de Lucas do Rio Verde. Foram coletadas amostras de leite de 62 mulheres, três da zona rural, entre fevereiro e junho de 2010, e a presença dos resíduos foi detectada em todas elas.

Vanderlei Pignatti lembrou que diversas pesquisas também indicam aumento na incidência de doenças como má-formação genética, câncer e problemas respiratórios, especialmente em crianças com menos de cinco anos de idade.

Ausência de estudos

Embora o Brasil seja o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, à frente dos Estados Unidos, com cerca de 1 bilhão de litros da substância sendo usados anualmente, conforme dados do Ministério da Agricultura, ainda faltam estudos que mostrem os impactos dessas substâncias na saúde do consumidor.

“Temos grandes desafios para revelar os impactos da exposição crônica, de longa duração e a baixas doses, que é o caso do consumidor urbano, que come todo dia um pouquinho de produtos contaminados”, alertou o professor Fernando Ferreira Carneiro, chefe do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB). Ele é um dos responsáveis por um dossiê que reúne pesquisas de vários especialistas brasileiros sobre os riscos do uso de agrotóxicos no país.

A maior parte dos estudos se refere à saúde dos trabalhadores rurais, que têm exposição direta a esses produtos e riscos elevados de intoxicação aguda, mais fácil de ser identificada em termos clínicos e laboratoriais. “Para o consumidor, no entanto, a situação ainda é pouco avaliada no Brasil”, disse.

A pesquisadora Lia Giraldo – professora do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco e membro do Fórum Pernambucano de Avaliação dos Efeitos do Agrotóxico na Saúde e no Ambiente – destacou que, apesar das lacunas na pesquisa científica nacional sobre o assunto, a literatura mundial comprova os efeitos tóxicos relacionados à exposição crônica a essas substâncias, por meio da ingestão de alimentos contaminados.

“A literatura científica no mundo mostra os efeitos negativos dessa exposição, que podem ser o surgimento de câncer, de alterações endócrinas, no desenvolvimento embrionário, no sistema nervoso hepático, renal, pulmonar, cardíaco entre outros. Além disso, estudos experimentais desses produtos comprovam diversas alterações em animais”, explicou.

Segundo a pesquisadora, o grande problema ligado à questão é a dificuldade de associar os problemas de saúde a esse contato. “Essas exposições não são facilmente percebidas e relacionadas aos problemas de saúde decorrentes, o que significa não ter o diagnóstico. No início dos agravos, você pode confundir com outros problemas de saúde”, ressaltou. “Além disso, não estamos expostos a um só tipo de agrotóxico, mas a vários, que se potencializam e interagem”, acrescentou.

Um relatório da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), divulgado no fim do ano passado, constatou que em 2010, 24,3% das 2.488 amostras de alimentos analisadas estavam contaminadas com agrotóxicos não autorizados e em 1,7% delas o nível de agrotóxico estava acima do permitido. O pimentão lidera a lista dos alimentos com grande número de amostras contaminadas por agrotóxico, seguido por morango e pepino.  

Com informações da Agência Brasil.

Nenhum comentário:

Postar um comentário