Encontrei o presidente da segunda maior mineradora do mundo.
16º andar de um prédio que cresce tão alto quanto profundos são os buracos que a empresa cava nos territórios e os impactos que deixa na vida das populações.
Lembrei-me de Moisés quando encontrou Faraó. Tremia a voz, mas a fala era firme, porque apresentava o sofrimento de um povo inteiro, escravizado, seduzido, enganado.
Faraó significa ‘Casa Grande’, centro do poder e do controle da economia e dos territórios.
Não há Casa Grande sem Senzalas. Não há riqueza acumulada sem consequências escondidas, ‘zonas de sacrifício’, impactos ‘inevitáveis e necessários’, que alguém deve sofrer para que muitos, supostamente, possam crescer.
O Deus de Moisés habita nesses retalhos de mundo sacrificados para a vida dos senhores da economia. Impulsiona, lá em baixo, a revolta organizada dos pobres.
O Deus de Faraó, que é um ídolo, para se manter em pé precisa da mentira. Não é uma mentira deslavada, nua, evidente. É a sedutora e disfarçada distância entre a propaganda, os ‘valores corporativos’, os ‘mantra da empresa’... e a prática real.
O Deus de Faraó, que é mudo, para se fazer escutar precisa de arrogância. Não é arrogância explícita, direta. É a violência simbólica de quem impõe seu poder em cima de comunidades que não têm elementos ou força para se contrapor.
O Deus de Faraó, que não tem coração, para se fazer amar precisa de sedução. Sedução feita de promessas raramente cumpridas, de milhões de dólares de marketing, de muita maquiagem que torna a empresa e o progresso bonitos de longe e fedidos de perto.
Como foi que Moisés e seu povo conseguiram afastar-se de Faraó e pôr-se a caminho em busca de uma nova terra, em construção permanente de novas relações e de uma nova sociedade?
Acho que a chave da libertação está nessa visita de Moisés à casa de Faraó: o israelita, mesmo gaguejando, não se deixou seduzir pela lábia de Faraó, não introjetou a fala do senhor do Egito e não desistiu do Deus frágil e pequeno que estava se manifestando aos escravos.
De alguma forma, intuiu e acreditou que havia mais verdade na voz daquelas vítimas e que a vida fazia mais sentido se vivida ao lado de seu próprio povo, e não na mansão de Faraó.
Moisés é cada um/a de nós que vivemos nas comunidades atingidas por esse modelo de desenvolvimento.
Todo dia sofremos a tentação que a lógica de Faraó conquiste nosso coração, ou um amigo nosso, uma liderança que de repente abandona o trabalho coletivo, a resistência, o povoado...
Libertação, ainda antes de sairmos da dominação, é não deixar entrar o dominador dentro de nós.
(encontram aqui uma matéria sobre essa reunião).
Pe. Dário Bossi
Missionário Comboniano e pároco em Açailândia
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