O
uso excessivo de agrotóxicos nas lavouras brasileiras preocupa cada vez
mais os especialistas da área de saúde. A aplicação de substâncias
químicas para controlar pragas nas plantações e aumentar a produtividade
da terra acaba se tornando um problema para os trabalhadores rurais e
consumidores.
Para alertar a população e chamar a
atenção das autoridades sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde dos
brasileiros, o Grupo de Trabalho de Saúde e Ambiente, da Associação
Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco), em parceria com
outras instituições, lançou nesta sexta-feira (27/04), durante o
Congresso Mundial de Nutrição, no Rio de Janeiro, um dossiê reunindo
diversos estudos sobre o tema. O documento também será apresentado
durante a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável (Rio+20), que será realizada em junho no Rio.
De acordo com o professor Fernando
Ferreira Carneiro, chefe do Departamento de Saúde Coletiva da
Universidade de Brasília (UnB) e um dos responsáveis pelo dossiê, as
pesquisas indicam que o uso dos agrotóxicos ocorre no país de forma
descontrolada.
“O Brasil reforça o papel de maior
consumidor mundial de agrotóxicos e nós, que fazemos pesquisas
relacionadas ao tema, vemos que o movimento político é para liberalizar o
uso. A ideia desse dossiê é alertar a sociedade sobre os impactos do
consumo massivo, sistematizando o que já existe de conhecimento
científico acumulado”, disse.
Um dos estudos que fazem parte do dossiê
foi desenvolvido pelo médico e doutor em toxicologia da Universidade
Federal de Mato Grosso (UFMT) Vanderlei Pignatti. Ele conduziu análises
ambientais e examinou a urina e o sangue de professores e moradores das
áreas rurais e urbanas das cidades de Lucas do Rio Verde e Campo Verde,
em Mato Grosso. Os municípios estão entre os principais produtores de
grãos do estado.
“Observamos
resíduos de vários tipos de agrotóxicos na água consumida pelos alunos e
pelos professores, na chuva, no ar e até em animais. Além disso, essas
substâncias foram encontradas no sangue e na urina dessas pessoas. A
poluição ambiental é elevada e as pessoas ficam ainda mais suscetíveis à
contaminação porque não são respeitados os limites legais para
pulverização dos agrotóxicos, que são de 500 metros no caso de
pulverização aérea e de 300 metros para a pulverização terrestre”,
explicou.
Outro estudo do professor Pignatti já
havia encontrado resíduos de agrotóxicos no leite materno de moradoras
de Lucas do Rio Verde. Foram coletadas amostras de leite de 62 mulheres,
três da zona rural, entre fevereiro e junho de 2010, e a presença dos
resíduos foi detectada em todas elas.
Vanderlei Pignatti lembrou que diversas
pesquisas também indicam aumento na incidência de doenças como
má-formação genética, câncer e problemas respiratórios, especialmente em
crianças com menos de cinco anos de idade.
Ausência de estudos
Embora
o Brasil seja o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, à frente dos
Estados Unidos, com cerca de 1 bilhão de litros da substância sendo
usados anualmente, conforme dados do Ministério da Agricultura, ainda
faltam estudos que mostrem os impactos dessas substâncias na saúde do
consumidor.
“Temos grandes desafios para revelar os
impactos da exposição crônica, de longa duração e a baixas doses, que é o
caso do consumidor urbano, que come todo dia um pouquinho de produtos
contaminados”, alertou o professor Fernando Ferreira Carneiro, chefe do
Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB). Ele é
um dos responsáveis por um dossiê que reúne pesquisas de vários
especialistas brasileiros sobre os riscos do uso de agrotóxicos no país.
A maior parte dos estudos se refere à
saúde dos trabalhadores rurais, que têm exposição direta a esses
produtos e riscos elevados de intoxicação aguda, mais fácil de ser
identificada em termos clínicos e laboratoriais. “Para o consumidor, no
entanto, a situação ainda é pouco avaliada no Brasil”, disse.
A
pesquisadora Lia Giraldo – professora do Programa de Pós-Graduação em
Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco e membro
do Fórum Pernambucano de Avaliação dos Efeitos do Agrotóxico na Saúde e
no Ambiente – destacou que, apesar das lacunas na pesquisa científica
nacional sobre o assunto, a literatura mundial comprova os efeitos
tóxicos relacionados à exposição crônica a essas substâncias, por meio
da ingestão de alimentos contaminados.
“A literatura científica no mundo mostra
os efeitos negativos dessa exposição, que podem ser o surgimento de
câncer, de alterações endócrinas, no desenvolvimento embrionário, no
sistema nervoso hepático, renal, pulmonar, cardíaco entre outros. Além
disso, estudos experimentais desses produtos comprovam diversas
alterações em animais”, explicou.
Segundo a pesquisadora, o grande
problema ligado à questão é a dificuldade de associar os problemas de
saúde a esse contato. “Essas exposições não são facilmente percebidas e
relacionadas aos problemas de saúde decorrentes, o que significa não ter
o diagnóstico. No início dos agravos, você pode confundir com outros
problemas de saúde”, ressaltou. “Além disso, não estamos expostos a um
só tipo de agrotóxico, mas a vários, que se potencializam e interagem”,
acrescentou.
Um relatório da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa), divulgado no fim do ano passado,
constatou que em 2010, 24,3% das 2.488 amostras de alimentos analisadas
estavam contaminadas com agrotóxicos não autorizados e em 1,7% delas o
nível de agrotóxico estava acima do permitido. O pimentão lidera a lista
dos alimentos com grande número de amostras contaminadas por
agrotóxico, seguido por morango e pepino.
Com informações da Agência Brasil.
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