Um ecossistema que décadas atrás era desprezado foi reconhecido pelos cientistas como um grande aliado no combate ao aquecimento global. É o manguezal, tema da série de reportagens especiais de Vladimir Netto e Hélio Gonçalves que o Jornal Nacional começa a exibir nesta quinta-feira (28).
No sobe e desce das marés, onde o rio encontra o mar, nasce o manguezal, um dos ecossistemas mais produtivos e generosos da Terra.
“Ele garante abrigo sem cobrar nada. Ele garante alimento sem cobrar nada. Ele purifica a água sem cobrar nada. Não é uma mãe?”, explica a bióloga Yara Schaeffer-Noveli.
Um ambiente que soube se adaptar a condições extremas: árvores que aguentam a água salgada e equilibram as raízes na lama trazida pelos rios. Características únicas que são estudadas há décadas no manguezal de Cananéia, litoral sul de São Paulo, por pesquisadores como a bióloga Marília Cunha-Lignon.
“O monitoramento dá para a gente a saúde do manguezal, por exemplo, aqui a gente tem certeza que são manguezais extremamente conservados, são manguezais que estão produzindo recurso natural”, aponta Marília.
Cada vez mais estudado, o manguezal é visto hoje como um dos maiores aliados do homem na luta contra os efeitos do aquecimento global. A lama, que filtra a água, soterra toneladas de sedimentos trazidos pelo rio.
“Então nós temos um controlador de efeito estufa. O manguezal tem uma competência de fixar carbono dez vezes superior ao das florestas tropicais. Isso é bastante novo. Isso é muito recente, essa informação”, reforça Yara.
Além de tudo, o mangue ainda é o berçário da vida marinha. O emaranhado de raízes submersas abriga centenas de espécies de animais.
“O baiacu é uma das primeiras espécies de peixe que entram quando a maré enche. O baiacu sem espinho. É um filhote. Está procurando a região justamente para se proteger entre as raízes”, conta Marília.
A pesca costeira depende muito dessa proteção. Na região de Cananéia, a pesca é a principal atividade econômica. Um lugar onde a profissão de pescador ainda passa de pai para filho. Dessas águas, saem 70% de tudo o que é pescado no litoral de São Paulo. De acordo com especialistas, essa grande quantidade de peixes é resultado direto da conservação dos manguezais.
Mas nem sempre foi assim. Uma vez a ostra quase acabou no manguezal. A saída foi criar uma reserva extrativista e controlar a produção.
O pescador Chico Mandira é o líder de uma comunidade quilombola que vive do mangue há mais de 30 anos. Ele saiu para catar ostras e nós acompanhamos esse trabalho.
Na canoa, Mandira e o filho Luiz contam que eles mesmos vigiam tudo com ajuda de outros pescadores. Ostras, por exemplo, ficam no viveiro para crescer até o tamanho certo para a venda.
“A quantidade de ostra que tinha no mangue já estava assim quase em extinção. Aí a gente criou uma regra dentro da comunidade para que o pessoal respeitasse o tamanho também. Aí isso veio agregar mais ostra”, lembra Chico.
Hoje, Chico recolhe 10 mil dúzias por ano, em média. A produção é vendida por uma cooperativa de pescadores. “Se você cuidar, você vai ter mais. Você vai tirar o seu sustento e vocês vão ter mais. Quanto mais você cuidar, mais você vai ter”, diz ele.
Depois de uma manhã de muito trabalho, em casa, a mesa farta é o resultado do que Chico acabou de falar.
“Hoje vai ter arroz, feijão. Vai ter farofa de ostra, ostra in natura e ostra gratinada. Ostra é o prato principal”, diz a mulher.
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