Proposta que disponibiliza terras da União para o mercado imobiliário e incentiva a especulação e grilagem é aprovada em poucos minutos e sem debate
Protesto do Greenpeace em frente ao Congresso Nacional denuncia onde começa o fim da floresta (© Leonardo Milano / Greenpeace)
Mesmo em meio ao caos político e às graves denúncias que recaem sobre o presidente Temer, a Câmara dos Deputados rasgou a Constituição ao aprovar nets quarta (24), em votação relâmpago e sem debate, a polêmica Medida Provisória (MP) 759/2016, que dispõe sobre a regularização fundiária e urbana
O texto, apresentado por Temer, abre a possibilidade de transferência de terras da União a grandes especuladores fundiários, anistia grileiros de terras, enfraquece a reforma agrária e acaba com o conceito de uso social da terra. A MP vai agora para o Senado e se for aprovada sem alterações, segue para sanção presidencial.
Pelo projeto, em apenas dois anos o governo Temer estaria liberado para emitir três vezes mais títulos de terra de assentamentos do que o acumulado nos últimos 16 anos dos governos Fernando Henrique e Lula. Com isso, disponibilizaria grandes volumes de terras públicas para o mercado de especulação fundiária, aumentando a disputa pela posse da terra e a violência no campo. Decorrente dos inúmeros incentivos dados à grilagem de terras públicas previstos na medida, o desmatamento de florestas, principalmente na Amazônia, poderá aumentar de forma significativa.
Segundo nota técnica do Ministério Público Federal (MPF), a medida não respeita a Constituição. “A previsão de indenização mediante pagamento em dinheiro por desapropriações para fins de reforma agrária é inconstitucional”, afirma a nota. Para o MPF, o texto resultará no aumento da concentração fundiária e no agravamento do desmatamento.
O texto é realmente grave e foi enviado ao Congresso sem nenhuma participação da sociedade e de estudiosos da área.
“A medida reformula e revoga uma série de legislações sobre regularização fundiária que vem sendo discutidas há décadas. Anular décadas de trabalho e instituir novas regras via MP, sem nenhuma consulta pública e sem envolver especialistas, é uma aberração”, avalia Marcio Astrini, coordenador de Políticas Públicas do Greenpeace. “A MP vai aumentar o desmatamento e incentivar a violência no campo. Ela coloca a propriedade privada à frente do uso social da terra. O texto foi feito ao gosto dos grileiros de terras, latifundiários, especuladores e máfias do desmatamento da Amazônia. O que já era caótico, vai piorar. O que era crime, agora vira lei”, complementa.
Os abusos e inconstitucionalidades da MP 759 já foram apontadas em carta pública escrita por dezenas de organizações da sociedade civil, incluindo o Greenpeace. Um resumo do ataque a direitos e territórios e as tramas da bancada ruralistas para se apossar do patrimônio público e vendê-lo a grandes empresas e investidores internacionais também foi bem revelado em recente artigo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) publicado no O Globo.
Vale ressaltar que sanção da MP da Grilagem vai intensificar ainda mais a violência no campo. Nos últimos dias, Colniza, no Mato Grosso, foi palco de uma chacina de nove trabalhadores rurais. Em Vilhena, Roraima, três pessoas foram carbonizadas e em Santa Maria dos Barreiros, no Pará, outras quatro pessoas foram encontradas queimadas. Sem contar o brutal ataque aos Gamela, que, embora não tenha deixado mortos, vitimou 22 pessoas, sendo que algumas tiveram membros mutilados. Ao entrar em vigor, a medida vai escalar ainda mais as disputas por terra e como consequência, as mortes e a violência nos campos brasileiros.
Infelizmente, a MP 759 não é um caso isolado. Ela faz parte de um pacote de medidas patrocinado pela bancada ruralista, com apoio do governo, visando enfraquecer a legislação ambiental e os direitos indígenas, quilombolas e dos povos tradicionais.
Beneficiar grileiros, vender as terras do país aos estrangeiros, acabar com a reforma agrária, liberar agrotóxicos, flexibilizar o Licenciamento Ambiental e acabar com as Unidades de Conservação estão na lista de propostas dos parlamentares ruralistas há muito tempo. “Agora, porém, as propostas encontraram, no núcleo do atual governo, gente disposta a servir a este tipo de propósito”, pontua Astrini.
Diante deste cenário, organizações e entidades ambientalistas, indígenas, de direitos humanos e do campo decidiram se unir em um movimento de resistência contra as medidas da dobradinha Temer-ruralistas que violam direitos humanos e colocam em risco a proteção do meio ambiente. Até o momento, cerca de 140 organizações já participam do movimento #Resista.
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