As Mulheres Agroextrativistas do Babaçu – A Pobreza a Serviço da Preservação do Meio Ambiente

O presente trabalho busca mostrar a importância de uma categoria de pequeno produtor familiar (as mulheres agroextrativistas do Maranhão ou quebradeiras de coco babaçu) que no setor agrícola local assume uma particularidade única. Não só pelo número, que representa 10% da força de trabalho da agricultura, mas,sobretudo, pelo papel que desempenha na preservação do meio ambiente, a favor da reforma agrária e no combate à exclusão social, da qual é vítima. Mostra-se ainda que o trágico quadro de pobreza em que estão inseridas essas mulheres se relaciona à devastação do seu principal meio de subsistência, o coco babaçu, e da política governamental implementada ao longo de décadas. No início dos anos 90, com a constituição de uma ONG (Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu – MIQCB), elas têm lutado para dar um outro rumo à atuação do Estado e do agronegócio no que se refere ao meio ambiente. Este segmento social assume assim um papel que constitucionalmente caberia ao Estado executar, mas do qual se omite.

1. INTRODUÇÃO
No Estado do Maranhão, três atividades produtivas se destacam no cenário agrário. Majoritariamente, tem-se a pecuária empresarial, a mais importante das três, oriunda da década de setenta, período de incentivos fiscais e crédito rural farto e barato; a ocupação com pastagens é de algo em torno de 5 milhões de hectares. Em seguida, a agricultura temporária, baseada, sobretudo, na cultura do arroz e da soja. A primeira, tocada à base do trabalho familiar, em pequena escala e articulada ao mercado nacional, muito importante até os anos oitenta, e a segunda, estruturada em base capitalista, que emerge no final dos anos noventa e tem por trás o médio e o grande produtor atrelado ao mercado internacional. A última atividade importante é o extrativismo do babaçu3. Sua relevância atual não se encontra no aspecto econômico (renda gerada, que já foi importante nos anos 70), que é declinante, mas no caráter eco/preservacionista, político e social que assumem seus atores sociais – as mulheres agroextrativistas ou quebradeiras de coco babaçu – através do seu principal organismo de atuação, o MIQCB (Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu).
No Maranhão, a atividade extrativa do babaçu, sob o ponto de vista de sua oferta, sempre esteve associada à agricultura familiar (AF) e se caracteriza por ser ultra-extensiva. A estimativa, de acordo com Almeida (1995), é de que haja uma área de 4.722.812ha efetivamente ocupada (1985, p. 18) e intensiva em mão-de-obra familiar; de acordo com o IBGE (1996), uma parcela significativa das 407.347 mulheres estabelecidas na atividade agrícola e que não recebem remuneração vincula-se à extração do babaçu (MESQUITA, 2001).
Por outro lado, embora a economia do babaçu esteja presente em quase todos os municípios do Estado (217) e, conseqüentemente, ocupe uma parcela importante da força de trabalho da agricultura, a sua área de concentração, de acordo com zoneamento ecológico, se restringe a um número reduzido de microrregiões e municípios (MESQUITA, 2001, p. 92).4 Essa região, ocupada por uma massa considerável de não-proprietários – arrendatários, parceiros e ocupantes – algo em torno de 251 mil (IBGE, 1996) e de alta concentração da terra e da renda monetária, é também o locus por excelência da pobreza rural (e feminina), onde ela é mais aguda e as desigualdades mais acentuadas, mas também é o território onde contraditoriamente esses excluídos lutam e barganham pela proteção do meio ambiente, contra a devastação de palmeiras (floresta) de babaçu, principal gerador de renda, e pela adoção de políticas públicas de inclusão social. Dentre os atores sociais desse embate, destacam-se as chamadas quebradeiras de coco babaçu ou mulheres agroextrativistas do babaçu (ALMEIDA, 1995b).
2. A MUDANÇA QUE PENALIZA OS EXCLUÍDOS
Nas últimas três décadas, notáveis transformações se fizeram presentes em todos os setores econômicos – agricultura, indústria e, sobretudo, no comércio e nos serviços. Entre 1970 e 1990, foi de 8,8% a taxa de crescimento do PIB do Estado e das atividades relacionadas, o que evidencia tais mudanças (MESQUITA, 2006).
No caso do setor agrícola, que nos interessa mais de perto, as mudanças podem ser detectadas nas relações de produção e na representação política (o surgimento de inúmeras organizações de trabalhadores rurais combativos como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST e o MIQCB). Na parte referente à questão agrária, por exemplo, múltiplos aspectos chamam a atenção – concentração fundiária, avanço do trabalho assalariado, declínio dos pequenos produtores sem terra e queda na produção de alimentos básicos, além dos impactos ambientais advindos da expansão da pecuária e do agronegócio, especialmente no que se refere ao desmatamento de regiões voltadas ao extrativismo do babaçu (ALMEIDA, 2005).
Um aspecto, no entanto, ficou paralisado, o perfil fundiário do Estado do Maranhão; a terra continua muito concentrada; o alto índice de Gini relativo à posse da terra (0,901) corrobora essa assertiva (PORRO, 2004).
Fato semelhante pode ser observado na condição do produtor. Os mini, isto é, com menos de 10ha, e os grandes, acima de mil hectares, perderam espaço, em termos de número e de área apropriada, para os pequenos (abaixo de 100ha) e médios produtores (abaixo de 1.000ha). Nesta contenda, o grupo de não–proprietários, os sem terra, foi o maior prejudicado em todos os sentidos.
Entre 1970 e 1995, sua participação decresceu 22% e 53% em número e área, respectivamente(IBGE, 1970, 1996).
No que se refere às relações de trabalho, percebe-se que, apesar do avanço do agronegócio no Maranhão, o trabalho familiar (membro não-remunerado da família – MNRF), que constitui ainda a base de sustentação para as atividades não-capitalistas – a agricultura familiar e o extrativismo –, continua importante (80% em 1995, mas 5% menor em relação a 1970), apesar do avanço (327%) das relações de assalariamento, temporárias e permanentes, em igual período.
Na parte produtiva ligada à agricultura familiar – arroz, mandioca e babaçu –, houve um encolhimento da área plantada e do volume colhido, desde a segunda metade dos anos oitenta, enquanto a agricultura empresarial (soja) se expandia vigorosamente (mais de 20% a.a.). Esse fenômeno está articulado, de um lado, à política comercial inerente ao modelo neoliberal e, de outro, ao lobby de cada uma dessas categorias de produtores na indução de medidas favoráveis à sua atividade, e não de pressão relacionada à expansão da área com pastagem e do crescimento do rebanho.
3. POLÍTICA GOVERNAMENTAL, DESMATAMENTO E EXTRATIVISMO DO BABAÇU
Nos últimos anos, as repetidas altas taxas de desmatamento da Amazônia Legal (inclusive o Maranhão), segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em torno de 15.000 km², viraram motivo de preocupação de todos os envolvidos com o meio ambiente. Na maior parte, o fim a que se destina o desmatamento é a pecuária extensiva que a cada dia ganha novos adeptos, inclusive entre pequenos produtores (AF).
Essa expansão, até 1985, esteve associada fundamentalmente aos benefícios governamentais e outros como a garantia de mercado, segurança e liquidez que a pecuária representa frente à agricultura familiar e ao extrativismo. Mais recentemente (final de 1990), a expansão e a transformação da pecuária ligam-se também a esses fatores (exceção dos incentivos fiscais) e às perspectivas que o mercado, nacional e internacional, sinaliza em termos de rentabilidade e dos custos marginais menores que a implantação de novas pastagens representa, em relação à recuperação das áreas degradadas anteriormente, na década de oitenta. Tal fato ocasionou mudança na paisagem em termos de uso e do acesso à terra, ao substituir milhões de palmeiras por capim e de privatizar de forma ilegal5 milhões de hectares de terra, cujo acesso passa a ser dificultado à coleta de babaçu.
Mais grave do que o desmatamento, que avança inexoravelmente em todas as direções, sem qualquer ação efetiva que freie essa tendência, é a questão da reprodução de uma estrutura econômica e social cada vez mais injusta, que não acena para qualquer tipo de mudança favorável aos segmentos excluídos e força outros a se submeterem a uma lógica de mercado apoiada pelo governo, que só é adequada ao capital (ALMEIDA et al, 2001; MIQCB/DFID, 2003).
O extrativismo do coco babaçu, segundo estudo da Secretaria do Meio Ambiente de 1982, abrange 30% da área geral do Estado (320 mil / km2); as microrregiões mais representativas (em produção) são as do Médio Mearim, Codó, Pindaré e Baixada Maranhense. Mas, em termos de taxa de crescimento, outras microrregiões também estão presentes – Chapadinha e Baixo Parnaíba (MESQUITA, 2001).
Relacionando o desempenho da atividade extrativa com outras variáveis, entre 1970 e 1995, percebe-se, pela figura 1, uma certa estagnação da produção extrativa, que se relaciona com a cultura do arroz, com a situação de não-proprietário e com o trabalho familiar, e, de outro lado, com a expansão da pecuária empresarial e o desmatamento6.
ima.13
Não há dúvida de que a pecuária, nos moldes em que se realiza no Estado, extensivamente, juntamente com a monocultura da soja e do eucalipto, ao disputar de forma desigual recursos financeiros (escassos e limitados) com outras atividades, a exemplo da agricultura familiar e do extrativismo do babaçu, constituiu um fator de pressão, especialmente no período de crédito subsidiado e de incentivos fiscais (década de 70), contra a expansão destes pequenos produtores atrelados à pequena produção familiar.
Levando em consideração as mesorregiões do Estado e o período de 1970/1995, nota-se um declínio de 6% na oferta geral, embora as mesorregiões Centro e Oeste apresentem um desempenho positivo, respectivamente 9% e 4%. Essa performance declinante do extrativismo está relacionada à abertura do mercado local à concorrência, no final dos anos 80, do óleo asiático de palmiste7, principal substituto do óleo de babaçu na indústria de cosméticos e de óleo comestível, que prossegue no governo Collor8; este aprofundou ainda mais a crise do babaçu9, seja no aspecto da coleta, que diz respeito às quebradeiras, seja no setor industrial, escoadouro desta matéria-prima10. O resultado foi uma violenta compressão da renda desta categoria de produtores (ALMEIDA, 2005; MESQUITA, 2006).
4. DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, POBREZA RURAL E EXCLUSÃO SOCIAL
Apesar do desenvolvimento econômico alcançado pelo país em termos de crescimento da renda real per capita, esse aspecto em quase nada contribuiu para melhorar a situação de milhões de pobres, especialmente daqueles que se localizam no meio rural. Dados de diferentes fontes (IBGE, IPEA, PNUD, entre outros) constatam essa crua realidade, em particular de regiões como o Norte e o Nordeste do país. Tomando-se como referência o conceito de linha de pobreza ou o de extrema pobreza,11 percebe-se que houve até um declínio relativo entre 1991 e 2000 no Nordeste (saiu de 85% para 77%). No entanto, o contingente populacional nesta categoria ainda conta-se em milhões.
E a perspectiva de mudança a curto e médio prazo não é nada alentadora, porque as principais atividades de tal segmento populacional – a agricultura familiar, a pecuária de pequeno porte e o extrativismo – pouco têm contribuído em termos de geração de renda que altere esse quadro trágico a que se encontra submetido (TANGERMANN, 2005).
Na realidade, como aponta Tangermann (2005) a situação deteriorou-se para cerca de 1/3 das famílias brasileiras que vivem abaixo da linha de pobreza. Mais recentemente, o que tem minimizado esse quadro de pobreza são os programas especiais do tipo Bolsa Família; mesmo assim, ainda uma parcela importante desses párias brasileiros não está incluída em programa do gênero.
Neste quadro lamentável, o Maranhão se destaca como o Estado onde esses índices de exclusão são os mais acentuados e com tendência a prevalecer, dado o imobilismo que reina no enfrentamento da questão e a dificuldade real de crescimento que se verifica na agricultura familiar (que responde pela produção de alimentos básicos) e no extrativismo do babaçu, atividades essas onde se encontra a parcela maior dessa população excluída.
A característica básica do Maranhão nos remete a um subdesenvolvimento crônico que se articula a um modelo econômico equivocado de desenvolvimento, que só faz aprofundar as desigualdades herdadas do período colonial entre pobre e ricos, e entre o rural e o urbano. As tão propagadas vantagens em termos de taxas de crescimento significativas que se registram no Maranhão entre 1970 e 1990, superiores às do Brasil e do Nordeste, não significam muita coisa, dado que a apropriação da riqueza passou ao largo do setor rural e em particular de categorias de produtores frágeis social e politicamente, como é o caso dos pequenos produtores e das mulheres extrativistas do babaçu.
Esse fenômeno pode ser observado tomando como referência alguns índices, tais como o de pobreza (renda per capita) ou outro mais amplo, como o Índice de Desenvolvimento Relativo (IDR), que afere a qualidade de vida da população dos municípios, construído por Lemos (1999). Segundo o autor, 2/3 da população do Estado se encontram num quadro de pobreza. Para o meio rural, a estimativa ainda é maior, cerca de 78%. Dos cem municípios com menor IDR, vinte e cinco estão no Maranhão; de forma análoga, dos 100 municípios de pior desempenho em termos de renda média mensal per capita do chefe da família, o Maranhão participa com 13! (LEMOS, 1999).
A questão central, que responde pela precariedade dos indicadores sociais e econômicos, arrolados pela literatura, especialmente da população rural maranhense, articula-se com o acesso e o uso do principal e fundamental meio de produção – a terra – e o acesso a recursos naturais que estão cada vez mais privatizados, como é o caso de terras públicas com babaçu e dos campos inundáveis da Baixada Maranhense, dos quais depende essa população de excluídos que sobrevivem do extrativismo e da agricultura de subsistência em terras de terceiros. Como as duas atividades estão há muito relegadas, sem política pública e jogadas à própria sorte, o perfil da pobreza rural tem pouca chance de alterar-se no Estado.
5. AS MULHERES DO AGROEXTRATIVISMO DO BABAÇU – GERAÇÃO DE RENDA, BANDEIRAS E ESTRATÉGIAS
5.1 Jornada de trabalho e geração de renda no extrativismo
Os pequenos produtores proprietários ou não-proprietários (parceiros, arrendatários e ocupantes) são os maiores responsáveis pela produção extrativa do babaçu, e no centro desta atividade e também da agricultura familiar estão as mulheres. Elas, como se sabe, desempenham na agricultura uma dupla jornada, já que, além do trabalho produtivo propriamente dito (na roça e no extrativismo), são também donas de casa, educadoras etc. Por outro lado, essa sua posição no trabalho extrativo do babaçu dá à mulher um “status” e uma responsabilidade, que é a da manutenção da família durante a safra do babaçu (setembro a fevereiro). É ela que, durante esse período, através da venda do babaçu, consegue manter a subsistência da casa, já que a roça está em fase de preparação. Embora essa renda não seja significativa (para os padrões da agricultura comercial), ela é essencial e, às vezes, a única fonte disponível de renda (diária) com que essas mulheres podem contar com segurança. As outras fontes de renda (trabalho temporário, doméstico, artesanal) dependem de terceiros e são conjunturais12.
Grosso modo, tomando como referência estudos já realizados, como os autores já citados anteriormente, a renda mensal da trabalhadora alcançaria algo em torno de R$ 120,00 na melhor das hipóteses, ou menos de 1/3 do salário mínimo atual de R$ 380,00.13
5.2 Dimensão, condição e localização da força de trabalho
Embora o IBGE ainda não informe a dimensão desta força de trabalho em termos específicos, ou seja, por categoria de produtor na atividade, já há estudos que enveredam por esse caminho, a exemplo de Shiraishi Neto (2000), Almeida (1995), MIQCB/DFID (2001), Porro(1995) e Mesquita (2001), e que nos dão a real importância deste segmento de trabalhadores rurais dentro do Estado. Mesquita (2001), baseado em dados do último censo (IBGE, 1996) estimou e quantificou o número de quebradeiras que se vinculam à atividade extrativa do babaçu; de acordo com o estudo haveria cerca de 135 mil mulheres nesta atividade; isso representaria algo em torno de 10% da força de trabalho total da agricultura (1.3331.000) no Estado do Maranhão naquela data do censo. O professor Shiraishi afirma que 82% das quebradeiras de coco babaçu são constituídas pela categoria de não-proprietário (2000 p. 44). A explicação de tais trabalhos passa pela questão da dificuldade de acesso à terra. Boa parte delas é de posse, herança, arrendadas ou de favor (cedidas por terceiros – fazendeiros, donos de lotes nos Projetos de Assentamento do Incra etc.).
Essa condição explica em parte por que a maioria das quebradeiras é classificada como sem terra ou ainda como minifundistas e estão incluídas dentre as categorias que vivem na linha ou abaixo da linha de pobreza. Um número considerável de mulheres há muito tempo estão residindo nas pontas de rua das cidades ou na beira das estradas, entre a faixa de terra das rodovias e as fazendas particulares, sendo qualificadas como tais (SHIRAISHI NETO, 2003, p 44). Nessas condições, essa mulheres quebradeiras estão obrigadas a pagarem renda a terceiros para terem acesso à coleta da matéria-prima (coco babaçu nas fazendas). Outras que detêm a posse da terra não pagam tal renda, mas estão submetidas na etapa da comercialização do produto a processo de exploração semelhante àqueles anteriores, já que estão no mesmo circuito do capital comercial responsável pela compra do babaçu. As quebradeiras de coco são numerosas nas mesorregioes do Médio Mearim, Codó, Caxias, Pindaré, Baixada Maranhense e Chapadinha.
5.3 A organização política (o MIQCB), bandeiras e embates
É no contexto de descrédito por parte de governos neoliberais do início dos anos noventa, e no embate entre lógicas diversas – de um lado, as mulheres extrativistas, de outro a burocracia estatal e os empresários do agronegócio –, aliado à luta cotidiana de longas datas na superação de obstáculos à sobrevivência, que emerge o Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB). Com uma área de atuação abrangendo quatro estados (Pará, Tocantins, Maranhão e Piauí), essa articulação de trabalhadoras rurais voltadas ao extrativismo do babaçu vem continuamente conquistando espaço político para suas propostas e reivindicações, sobretudo no plano nacional junto a órgãos institucionais e ministérios. O objetivo principal é a preservação do meio ambiente, em particular a questão do desmatamento ilegal do babaçu, ou seja, a derrubada clandestina, e a busca de meios de manutenção de atividades econômicas sustentáveis, como a exploração e beneficiamento do babaçu, num formato livre de intermediários, seja da terra (grandes proprietários), seja da comercialização (o comerciante e as empresas beneficiadoras da matériaprima – amêndoa do babaçu).
Embora o movimento se constitua, sobretudo, de trabalhadoras extrativistas que também são agricultoras familiares, essas mulheres, representantes legítimas do quadro de pobreza do Estado, nesse curto espaço de tempo em que estão formalizadas e na linha de frente do embate com diferentes segmentos, alguns reacionários à sua proposta de atuação na causa ambiental e na redução da pobreza, têm assegurado espaço e respeito político e obtido algumas respostas a suas demandas universais que outras ONGs não obtiveram.
O MIQCB, através de sua representação, reúne inúmeros atributos que poucas organizações com mais tempo de atuação ainda não conseguiram. De um lado, ressalta-se o caráter de gênero da organização e o endosso à questão do desenvolvimento sustentável como a bandeira principal do 8 processo de preservação ambiental. Em outro plano, organiza-se em termos de clubes e associações de mulheres, representação política em câmaras municipais, entidades e instituições. E, por fim, também se preocupa com a produção de conhecimento científico como meio de apoio que lhe possibilite conhecer adequadamente a sua realidade e assim obter elementos para o enfrentamento com a burocracia estatal e o empresariado do agronegócio.
5.4 As estratégias de enfrentamento
No enfrentamento e na busca de melhores condições de vida, que se traduzem na diminuição das desigualdades, seja do acesso à terra, seja da melhoria de renda, as mulheres agroextrativistas, através do MIQCB e também de outras instituições e entidades, a exemplo da Associação dos Assentados do Médio Mearim (ASSEMA) e da Cooperativa das Mulheres de Lago do Junco (MA), traçam estratégias que possibilitem alcançar seus objetivos, dentre eles a reivindicação ou construção de políticas públicas favoráveis à sua atuação.
Nesse sentido, a estratégia passa pela cobrança de posição, mobilização e organização de encontros, oficinas, audiências públicas e debates com diferentes segmentos da sociedade, envolvendo governos e instituições públicas e privadas. Além de se qualificar e fortalecer-se institucionalmente, com apoio importante de ONGs (nacionais e internacionais) e até de governos estrangeiros via cooperação internacional, a exemplo da Grã-Bretanha (Departamento Internacional de Fundos para o Desenvolvimento – DFID) e da União Européia.
No plano relacionado à preservação ambiental e à devastação de matas de babaçu, as quebradeiras, através do MIQCB, têm contra-atacado a política governamental voltada à expansão da pecuária, das monoculturas e da produção de carvão vegetal (do coco babaçu), todas com impacto negativo sobre o tamanho da área com babaçu e, portanto, fator de diminuição da renda advinda dessa atividade extrativa, sob diferentes formas, agindo diretamente sobre o evento ou denunciando a quem de direito as ilegalidades.
Outra forma de atuação (indireta), a mais usual, é a pressão política sobre os gestores e responsáveis pela implementação de políticas públicas. Um dos instrumentos dessa ação têm sido projetos de lei de âmbito nacional ou em nível local dispondo sobre a ação de terceiros (grandes proprietários e empresas rurais e guserias) no que se refere a desmatamento ilegal de babaçuais e de mata nativa e sobre o acesso à coleta de babaçu em áreas privadas. Tal proposta já foi aprovada em vários municípios do Maranhão e do Tocantins e atualmente transita na Câmara Federal.14 O resultado desta ação demonstra o compromisso e o respeito destas mulheres a favor da conservação da biodiversidade e da diminuição do desmatamento global.
6. CONCLUSÃO
Contraditoriamente, as mulheres agroextrativistas do babaçu, autênticas representantes da pobreza rural, são defensoras da preservação ambiental. Ao contrário do que a mídia, alguns estudos (BANCO MUNDIAL, 2003; TANGERMANN, 2005) e os empresários do agronegócio apresentam, não é esse segmento da produção familiar e do extrativismo o responsável pelo quadro desigual do meio local e muito menos pelo gigantesco desmatamento existente. Conforme Mesquita (2006), os responsáveis por esse cenário foram a pecuária empresarial, as monoculturas e atualmente o carvão e a mamona (com o futuro do biodiesel) e, portanto, o próprio Estado brasileiro, dado que ele foi (e é) o mentor desta forma de expansão do agrário local.
A pobreza endêmica do Maranhão há muito presente nessa categoria de produtores extrativistas, é, de um lado, um produto da riqueza de uma minoria, que se manifesta na alta concentração de terra e da renda, e, de outro, da ausência de políticas públicas voltadas à produção familiar e ao extrativismo, ou mesmo, de políticas econômicas neoliberais contrárias aos interesses desses segmentos de pequenos produtores.
No Maranhão de 2007, o agronegócio, com apoio do governo, deteriora o meio ambiente, devasta geometricamente (353 mil hectares/ano) e ainda gera mais miséria; enquanto isso, as vítimas – quebradeiras de coco babaçu e trabalhadores rurais – desse processo que potencializa as desigualdades, pelo menos nas últimas décadas, segundo fontes governamentais (IBGE, IPEA) e pesquisadores, é que empunham a bandeira da preservação do meio ambiente, seguram o desmatamento e propõem um desenvolvimento durável. Em outras palavras, assumem o papel que constitucionalmente é dever do Estado, pois é ele quem detém os instrumentos legais para executar tal tarefa, e no entanto se omite. É, portanto, no mínimo inusitada essa atuação advinda dos excluídos, acusados que são de ser culpados pela sua pobreza!
As condições estruturais, trinta anos depois da introdução, pelo governo, de um conjunto de instrumentos que visavam a alterar o trágico quadro social, em termos de relações de trabalho, concentração da terra e acesso às políticas públicas, dentre outros, permanecem tão graves ou piores do que antes, demonstrando que o diagnóstico de Caio Prado Jr. (1976) de 40 anos atrás continua atual. O que se quer dizer é que, apesar das transformações significativas que ocorreram na estrutura produtiva da economia do Estado e de mudanças nas relações de produção, a expansão da pecuária empresarial e de monoculturas como soja, cana e eucalipto não conseguiram mudar o quadro de pobreza daquela parte mais numerosa do meio rural maranhense, especialmente dos não proprietários onde estão incluídos os produtores agroextrativistas do babaçu, nem assegurar um desenvolvimento sustentável para a referida população. Ao contrário, a configuração que assumiu esse crescimento da produção capitalista no campo tem levado a uma diminuição contínua dos recursos extrativos e de matas nativas, cuja conseqüência é a inviabilidade de segmentos que dependem desse tipo de atividade.
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YOKOMIZO, Clando. A política de incentivos fiscais na Amazônia. Rio de Janeiro: IPEA. 1989.


Benjamin Alvino de Mesquita2 – Agência Prodetec

Quais ecossistemas são mais vulneráveis às mudanças climáticas?

por Jeremy Hance, do Mongabay
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Foto: Reprodução/Internet
Uma nova pesquisa, publicada no periódico Nature Climate Change, é a primeira a combinar os impactos esperados das mudanças climáticas com a degradação das ações humanas para criar uma lista das mais vulneráveis regiões do planeta. Entre as áreas em maior perigo estão o sul e sudeste da Ásia, o oeste e a parte central da Europa, o centro-leste da América do Sul e o sul da Austrália.
James Watson, principal autor do estudo, afirma que a pesquisa busca indicar “onde os recursos limitados [financiamentos climáticos] podem fazer mais diferença” para proteger os mais vulneráveis ecossistemas em um mundo em aquecimento.
“Precisamos perceber que as mudanças climáticas vão impactar ecossistemas de forma direta e indireta em uma grande variedade de maneiras e que não podemos continuar presumindo que todas as ações de adaptação são cabíveis em todos os lugares. O fato é que temos apenas fundos limitados e precisamos começar a pensar de forma inteligente em como utilizá-los ao redor do mundo”, disse Watson, que é diretor do programa de mudanças climáticas da Sociedade de Conservação da Vida Selvagem (WCS).
Para chegar às conclusões do estudo, Watson e sua equipe avaliaram a estabilidade dos ecossistemas sob cenários futuros de mudanças climáticas, uma vez que certos ecossistemas devem sofrer transformações mais drásticas do que outros. Por exemplo, o Ártico deverá ser uma das regiões mais afetadas pelo aquecimento global.
Depois, os pesquisadores combinaram esses dados com informações relativas à área ainda preservada em cada ecossistema, contando com o fato de que regiões mais intactas serão capazes de se adaptar melhor.
Dessa forma, o estudo observa que entre os locais menos vulneráveis, levando em conta os impactos climáticos e a atual degradação, estão o sul da América do Sul, o Oriente Médio, o norte da Austrália e a costa atlântica no sul da África.
mapa2 Quais ecossistemas são mais vulneráveis às mudanças climáticas?As regiões mais vulneráveis aparecem na cor creme, enquanto as menos vulneráveis em cinza escuro/preto. Regiões que são muito degradadas, mas que deverão ter clima estável estão em laranja escuro, enquanto aquelas relativamente intactas, mas que são sensíveis às mudanças climáticas estão em verde escuro.
Citação: James E. M. Watson, Takuya Iwamura& Nathalie Butt. (2013) Mapping vulnerability and conservation adaptation strategies under climate change. Nature Climate Change. doi:10.1038/nclimate2007.
* Publicado originalmente no Mongabay e retirado do site CarbonoBrasil

Litoral brasileiro é uma região prioritária para adaptação climática

por Fabiano Ávila, CarbonoBrasil
Estudo afirma que devido à sua biodiversidade, importância para a segurança alimentar e número de habitantes, praticamente toda a costa atlântica do Brasil deveria receber mais recursos para ações de adaptação às mudanças climáticas.
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Mapa com as 10 regiões prioritárias / PLOS One

O Fundo Climático Verde, mecanismo da ONU que promete repassar recursos para as nações em desenvolvimento se prepararem para as consequências das mudanças climáticas, ainda apenas existe de forma precária e, justamente por isso, classificar as regiões prioritárias para receber os poucos investimentos disponíveis é muito importante.
Nesse sentido, um estudo publicado nesta semana no periódico Plos One promete ser uma boa base para escolher onde alocar os financiamentos para ações de adaptação e mitigação climática.
O trabalho, realizado por um grupo internacional de cientistas liderado pelo biólogo norte-americano Lee Hannah, do Centro Betty e Gordon Moore para Ciências e Oceanos, identificou as dez regiões que deveriam receber mais atenção devido a critérios que levam em conta a biodiversidade, a produção de alimentos, a quantidade de habitantes e a vulnerabilidade às mudanças climáticas.
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1 – Albertine Rift / Conservation-strategy.org. 2 – Filipinas / Wikimedia commons. 3 – Mata Atlantica / Apremavi. 4 – Chocó Geográfico / Wikimedia commons.
As regiões e os ecossistemas prioritários:
  • Albertine Rift / Vale do Rift – Zaire, Burundi, Tanzânia e Uganda (Florestas de Afromontane)
  • América Central – México, Guatemala, Honduras, Nicarágua (Mesoamérica; Bosque de pinheiros na Sierra Madre Ocidental)
  • Andes – Argentina, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru (Andes tropicais e Chocó biogeográfico)
  • Caribe – Jamaica, Haiti, Dominica, Porto Rico, Venezuela (Ilhas caribenhas)
  • Costa Atlântica do Brasil – Brasil (Mata Atlântica)
  • Ghats – Índia (Ghats Ocidentais, Sri Lanka)
  • Filipinas
  • Java – Indonésia (Wallacea)
  • Madagascar – (Madagascar e Ilhas do Oceano Índico)
  • Terras altas da Guiana – Venezuela (Andes tropicais)
Segundo o estudo, essas dez regiões são únicas, pois reúnem, por exemplo, 70% de todas as espécies mundiais de pássaros, ao mesmo tempo que são lar de 10% da população mundial que vive em pobreza.
Além disso, para chegar à lista, os pesquisadores calcularam o número de espécies que serão perdidas de acordo com os modelos climáticos do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas e a queda da produção agrícola diante do aquecimento global prevista pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).
Apesar de destacar essas regiões como prioritárias, os pesquisadores não querem que outras áreas, como o Ártico, deixem de receber recursos.
“Vejo essas regiões como novos locais que devem ser adicionados à lista de recebedores de fundos, e não que deva existir uma competição pelo financiamento. Se pudermos proteger essas regiões onde a segurança alimentar e a biodiversidade estão sendo afetadas, tiraremos lições que podem ser utilizadas em todo o mundo e que nos ajudarão a alimentar os pobres e preservar espécies raras”, declarou Hannah.
As possibilidades de adaptação para essas regiões, incluindo para o litoral brasileiro, passam por uma maior integração entre a agricultura e os ecossistemas, explica o estudo.
Por exemplo, atividades agroflorestais podem ajudar a reduzir as temperaturas do solo mesmo diante da elevação das temperaturas do ar, e, com a escolha certa das espécies de árvores, ainda fornecer habitat para pássaros e outros animais.
O reflorestamento também é uma solução para lidar com a falta de água em regiões agrícolas que sofram com o declínio da precipitação, ajudando na manutenção da umidade do solo.
“Os fundos para adaptação às mudanças climáticas podem ser mais efetivos se buscarem objetivos integrados, mas ainda não há uma boa caracterização das prioridades geográficas baseada em critérios ecológicos e de desenvolvimento múltiplo. Aqui mostramos que a adaptação humana e da natureza precisam ser relacionadas para manter a produtividade agrícola e a integridade do ecossistemas”, conclui o estudo.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.

sábado, 21 de setembro de 2013

Dia da Árvore: você já comprou sua indulgência ambiental?

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A efeméride é uma mão na roda para nós, jornalistas. Na falta de pauta (não sei como, mas vá lá), é só consultar o oráculo na internet para ver o que há no cardápio. Daí descobre-se que, além da independência de Belize e da morte de Schopenhauer, também é Dia da Árvore.
Daí, ligo a TV e vejo matérias e mais matérias de pessoas plantando mudinhas, crianças fazendo desenhos com lápis verde, famílias abraçando árvores.
OK, a educação ambiental é tudo. Mas me tira do sério adotar a efeméride para cumprir tabela jornalística, quando sabemos que determinados editores barram sistematicamente a questão ambiental de seus noticiários por considerarem que é “discurso contra o desenvolvimento”, “interesse de gringos” ou “coisa de hippie”. Tenho um comichão quando vejo que populações indígenas e quilombolas, cuja qualidade de vida está diretamente atrelada à proteção ambiental, têm menos espaço em alguns veículos do que uma criança de apartamento plantando seu Ipê em uma praça de São Paulo num sábado de sol.
Sei que todos têm um milhão de outras preocupações para resolver no dia a dia. Mas se dedicassem o mesmo tempo que usam para se vestir de preto e fazer cara feia em piadas prontas, distribuir memes pela internet ou ficarem em infrutíferos debates desqualificados em redes sociais para tentar se informar e acompanhar como o meio ambiente está sendo rifado nos parlamentos e por governos em nome do “progresso”, visando a facilitar o crescimento econômico violento, coisas como os retrocessos do novo Código Florestal não teriam sido aprovados.
É mais barato comprarmos uma indulgência ambiental em forma de mudinha feliz ou de saco plástico biodegradável do que mexer o traseiro e agir para mudar o comportamento consumista que está levando o mundo para o buraco. Ou melhor, para o forno.
Afinal de contas, o que é mudar o comportamento individual? Basta fazer aquelas coisas mínimas para deixar  consciência menos pesada? Claro que não. Da mesma forma que há empresas caras-de-pau que acham que é possível fazer responsabilidade social e mudar o impacto que causam na sociedade sem gastar dinheiro, há pessoas que acham que dá para mudar o mundo não alterando seu padrão de consumo, comprando as mesmas coisas de sempre e transferindo sua felicidade para a maquininha do cartão de crédito.
Olhando o cenário e vendo a quantidade de gente que se importa mais com “parecer” do que “ser” sustentável, professando o mais cruel cada um por si e o sobrenatural por todos, não deixo de dar certa razão – apesar de discordar - para uma amiga que pergunta sempre: e vale a pena tentar construir um futuro para esse mundo que está aí?

Nova geração de transgênicos pode deixar lavouras brasileiras mais tóxicas

No Brasil, 90% dos agrotóxicos são utilizados em oito commodities agrícolas
No Brasil, 90% dos agrotóxicos são utilizados em oito commodities agrícolas
Brasil pode ser o terceiro a aprovar plantio de sementes resistentes ao agrotóxico 2,4-D. Especialistas alertam que o possível aval da CTNBio à soja e ao milho aumente o uso do herbicida altamente tóxico.
Joana Brandão Tavares, em DW
A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) julgou nesta quinta-feira (19/09) o pedido de aprovação de quatro modalidades de sementes transgênicas resistentes ao agrotóxico 2,4-D. São dois tipos de soja e dois tipos de milho.
O Brasil seria o terceiro a aprovar o plantio dessas variedades. Até o momento, o Canadá é o único que cultiva esse tipo de milho. Já essa versão de soja transgênica é aprovada, além do Canadá, também no Japão – mas a permissão no país asiático se restringe à plantação em campos isolados.
O pedido de liberação foi feito pela americana Dow AgroSciences, que também tem sede no Brasil e é uma das seis gigantes da indústria de sementes e agrotóxicos do mundo.
Segundo Leonardo Melgarejo, representante do Ministério do Desenvolvimento Agrário na CTNBio e avaliador de uma das sementes solicitadas pela Dow, existem “riscos alarmantes” na aprovação das sementes. “Nós estamos passando agora para a possibilidade de aplicação via aérea de produtos de alta periculosidade”, afirma.
O 2,4-D é um dos componentes do chamado Agente Laranja, utilizado pelos Estados Unidos durante a Guerra do Vietnã. Ele é o terceiro agrotóxico mais utilizado no Brasil (5%), depois do glifosato (29%) e do óleo mineral (6%). De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que regulamenta e avalia a toxicidade de agrotóxicos, o 2,4-D é classificado com o nível de toxicidade mais elevado.
Efeito reverso
A aprovação das sementes resistente ao 2,4-D pode levar a um efeito contrário: especialistas alertam que o uso do agrotóxico pode aumentar. Em artigo publicado na revista científica Environmental Science Europe, Chuck Benbrook, da Universidade do Estado de Washington, prevê um aumento de 50% no uso do 2.4-D nos Estados Unidos caso as novas sementes sejam aprovadas neste país.
O Centro de Segurança Alimentar dos Estados Unidos prevê que o uso do herbicida isoxaflutole aumentará quatro vezes devido à aprovação nos EUA de uma modalidade de milho resistente a este herbicida.
No Brasil, Victor Pelaez, diretor do Observatório da Indústria de Agrotóxicos e professor na Universidade Federal do Paraná, lembra que, quando a primeira soja transgênica foi aprovada, umas das possíveis vantagens apresentadas seria a diminuição do uso do agrotóxico glifosato. Oito anos depois, o glifosato continua sendo o agrotóxico mais utilizado no Brasil. Pesquisas do Observatório apontam que, após a utilização da soja transgênica no Rio Grande do Sul, ainda de maneira ilegal, entre 2000 e 2004, o consumo do glifosato aumentou 162%.
Esse consumo levou ao desenvolvimento de pragas resistentes e, por consequência, à necessidade de sementes tolerantes a herbicidas mais tóxicos. “Do ponto de vista tecnológico, é um retrocesso. Seja porque se tem que utilizar mais quantidade do glifosato que é menos tóxico, seja porque tem que se usar também produtos mais tóxicos. Isso era a crônica da morte anunciada. Todo mundo da área sabia disso”, analisa Pelaez.
Segundo a Dow, não há uma relação entre o uso elevado dos agrotóxicos e o uso de transgênicos. “As taxas de uso de herbicidas está já crescendo devido à resistência ao glifosato, e irá crescer ainda mais sem a nova tecnologia para ajudar a lidar com essa situação”, afirma Garry Hilman, porta-voz da empresa. Segundo ele, as novas sementes vão permitir que as ervas daninhas não desenvolvam resistência a um tipo específico de agrotóxico.
Aos ser questionado sobre a relutância de alguns países à aprovação das sementes tolerantes ao 2,4-D, a empresa afirma que se deve aos trâmites burocráticos dos países. “Nós estamos confiantes que os legisladores nas principais nações produtoras irão reconhecer os diversos benefícios desta nova tecnologia tanto para os produtores agrícolas como para o meio ambiente.”
Para a Secretaria Nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), as novas sementes não resolverão o problema do que tem se chamado de “falha tecnológica”. “Essas variedades, assim como as que as antecederam, chamadas de ‘melhoradas’, termo que não utilizo pois apenas foram selecionadas em laboratório, não melhoraram em nada a agricultura, pois causou uma grande redução na base genética das culturas alimentares”, afirma o MPA em declaração à DW Brasil.
Passado sombrio
O 2,4-D ficou mundialmente conhecido por compor o Agente Laranja, utilizado para desfolhar as florestas e expor vietnamitas ao ataque dos Estados Unidos durante a Guerra do Vietnã. Milhões de pessoas morreram devido à operação conhecida como “Mão de fazendeiro” e, 30 anos depois, a substância química ainda é encontrado na terra e água do país, levando a defeitos genéticos em várias gerações.
A Dow AgroSciences, junto com três outras empresas do ramo de biotecnologia, montou a Força Tarefa 2,4-D, com o objetivo de divulgar informações sobre o herbicida. Elas afirmam que a vinculação com o Agente Laranja é um equívoco, pois os efeitos letais deste químico seriam causados pela dioxina, um resíduo da mistura dos componentes 2,4-D e 2,4,5-T da fórmula do Agente Laranja.
No entanto, especialistas apontam que a toxicidade do 2,4-D independe de sua vinculação com a dioxina. Em nome da Academia Americana de Medicina e Meio Ambiente, Robin A. Bernhoft afirma que “o 2,4-D é considerado a causa de todos os cânceres e defeitos genéticos nos filhos de ex-combatentes americanos no Vietnã e de vietnamitas causados pelo Agente Laranja”.
A questão reside também na qualidade do 2,4-D utilizado. Benbrook aponta o risco de que maior parte do 2,4-D usado no Brasil seja importado da China, com altos níveis de dioxina. “Eu concordo que o 2,4-D da Dow é muito mais limpo do que o dos 1970, mas quem pode garantir que os agricultores brasileiros irão comprar o 2,4-D mais caro e mais limpo?”, questiona.
Melgarejo aponta para o mesmo problema, devido à utilização da forma de 2,4-D conhecida como éster butílico, considerada mais perigosa por formar mini-gotículas que dispersam facilmente no meio ambiente.
“Nesse caso, o produto dança no ar, ele se desloca por grandes áreas e pode afetar muitas outras culturas. É uma formulação mais barata, porque mais perigosa”, esclarece. “As empresas afirmam que não vão vender no Brasil. Mas nada impede que entre por contrabando”, alerta Melgarejo.
Os riscos do 2,4-D-éster-butílico levaram a Autoridade Australiana para Medicina Veterinária e Agrotóxicos (APVMA) a cancelar, em agosto, a autorização do uso dessa modalidade de herbicida na Austrália alegando “riscos ambientais inaceitáveis”.
Aprovação
O Brasil já aprovou 56 organismos geneticamente modificados. Das 31 plantas, contando com sementes e algodão, 25 possuem alteração para resistir a agrotóxicos e doze são tolerantes a mais de um herbicida ou inseticida. A tolerância, em grande maioria, é aos agrotóxicos glifosato e glufosinato de amônico, ambos de baixa toxicidade.
As duas modalidades de milho e de soja foram apresentadas pela empresa Dow no ano de 2012 e 2013 para liberação comercial. Quando concedida, a liberação permite a venda das sementes transgênicas para plantação, seu consumo direto em alimentos e derivados, assim como utilização em rações animais.
Caso as sementes resistentes ao 2,4-D sejam aprovadas pela CTNBio, o processo é encaminhado ao Conselho Nacional de Segurança, que pode deferir ou indeferir a decisão da Comissão.


sábado, 14 de setembro de 2013

Ibama intensifica fiscalização para combater desmatamento ilegal na Amazônia


Agência Brasil
SÃO LUÍS - Mais de 1,5 mil agentes ambientais e militares do Exército estão atuando na Amazônia Legal para combater o desmatamento ilegal. As equipes contam com seis helicópteros e mais de 100 veículos adaptados para apoiar as operações Onda Verde e Hileia Pátria, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
O resultado, até agora, foi o embargo de 252 mil hectares e a apreensão de 117 mil metros cúbicos de madeira serrada e 68 mil de metros cúbicos de madeira em tora. Também foram emitidos 4 mil autos de infração, com multas que chegam a R$ 1,9 bilhão, e apreendidos 158 tratores, 86 caminhões, 291 motosserras e 44 armas de fogo.
De caráter preventivo, a Operação Onda Verde começou em fevereiro e tem seis frentes atuando centradas em áreas críticas, que respondiam por mais de 70% do desmatamento da Floresta Amazônica. Os fiscais ambientais estão concentrados no norte de Rondônia, nas imediações da capital, Porto Velho, e no sul do Amazonas, no eixo da Transamazônica, em que os alertas de desmatamento e de degradação são provocados por pressão da agropecuária, da grilagem e de assentamentos.
Com duração prevista até o fim do ano, a Onda Verde tem ainda duas bases em Mato Grosso, nos municípios de Sinop e Juína, com grande influência da agropecuária, e três bases no Pará, em Novo Progresso, onde se concentram os casos de grilagem e pecuária, e em Anapu e Uruará, com grande pressão da pecuária e dos assentamentos.
Em maio, foi incorporada uma nova frente de trabalho, a Hileia Pátria, que tem apoio logístico e de inteligência do Exército e atuação mais repressiva, para coibir a extração ilegal de madeira em terras indígenas e unidades de conservação. No Maranhão, agentes ambientais estão percorrendo as áreas indígenas de Alto Turiaçu, Awá, Caru e Arariboia, além da Reserva Biológica do Gurupi. Eles fecharam 27 serrarias, o que resultou na apreensão de 4 mil metros cúbicos de madeira beneficiada e em toras. As multas aplicadas até o momento chegam a quase R$ 4,5 milhões.
A Hileia Pátria tem ações também em Rondônia, no Pará, no Amazonas e em Mato Grosso. “Observamos em várias situações a tentativa de burlar a fiscalização com camuflagem de equipamentos com tratores pintados de verde e escondidos no meio da floresta”, disse o coordenador-geral de Fiscalização Ambiental do Ibama, Jair Schmitt.
Na terça-feira (10), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Ibama informaram que o número de alertas sobre desmatamento e degradação da Floresta Amazônica aumentou 35% entre agosto de 2012 e julho de 2013, na comparação com igual período anterior. As imagens de satélite do Sistema de Detecção de Desmatamentos em Tempo Real (Deter) orientam as equipes ambientais onde há concentração de alertas para que a fiscalização se intensifique nesses locais.
Segundo Schmitt, o aumento de alertas está relacionado à degradação por uso do fogo e por exploração seletiva da madeira. “O papel da fiscalização ambiental é fazer com que as áreas degradadas não sejam convertidas em corte raso [remoção total da floresta nativa em uma área] e que não exista uma atividade produtiva ilegal nessas áreas”.
Schmitt ressaltou que há uma mudança na dinâmica do crime ambiental, já que “o infrator não se arrisca mais a fazer o corte raso imediatamente”, por causa do trabalho dos fiscais e do monitoramento diário dos satélites. “O infrator primeiro começa fazendo uma degradação pelo fogo, mas o Ibama consegue interferir nesse processo antes que se converta em desmatamento ilegal.”

Conama aprova licenciamento ambiental para aquicultura



Agência Brasil
A expectativa é que a nova resolução seja publicada no Diário Oficial da União ainda neste mês.
BRASÍLIA - O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aprovou, na semana passada, novas diretrizes nacionais que alteram a Resolução 413/2009, tornando mais simplificado e rápido o licenciamento ambiental para empreendimentos aquícolas (cultivo de peixes de água doce e salgada). A expectativa é que a nova resolução seja publicada no Diário Oficial da União ainda neste mês. Publicada, entra em vigor automaticamente.
A previsão do Ministério da Pesca e Aquicultura é que o licenciamento de parques aquícolas, que poderia demorar até seis anos, seja viabilizado em até três meses. “A resolução deixa mais ágil o processo de licenciamento pelo fato de trabalhar com uma licença única. Antes eram necessárias as licenças prévia, de instalação e de operação. Todos os órgãos ambientais estaduais deverão atender à nova resolução, alicerçada na preservação da biodiversidade e na proteção sanitária para as espécies cultivadas”, explicou a secretária de Planejamento e Ordenamento da Aquicultura, Maria Fernanda Nince.
Atualmente, o licenciamento para a aquicultura em águas de domínio da União é feito pelos órgãos estaduais com critérios e procedimentos diversos. Eles são definidos por legislação local, o que pode resultar em tratamento desigual a produtores de uma mesma atividade.
Entre os critérios para a concessão da licença simplificada está o uso de espécie autóctone (natural da região). Também poderá ser usada espécie alóctone (não originária da região), desde que sejam apresentadas medidas de mitigação de possíveis impactos. A nova resolução prevê ainda a apresentação de anteprojeto técnico do empreendimento aquícola bem como estudo ambiental e programa de monitoramento da área.
De acordo com Maria Fernanda, o setor será impulsionado com a nova medida, já que haverá mais agilidade na licitação de empreendimentos aquícolas. Atualmente, estão abertos editais para áreas em parques aquícolas em Goiás, Mato Grosso, Tocantins, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Pernambuco, na Bahia, no Paraná e no Rio de Janeiro. “A licitação será nas modalidades onerosa, para o grande produtor, e social, voltada para o pequeno produtor”, disse a secretária.
No Brasil, a aquicultura já responde por 40% de toda a produção de 1,3 milhão de toneladas de pescado por ano. Segundo o Ministério da Pesca e Aquicultura, a atividade gera um PIB (Produto Interno Bruto) pesqueiro de R$ 5 bilhões, mobiliza 800 mil profissionais e proporciona 3,5 milhões de empregos diretos e indiretos. A meta do ministério é que, em 2030, o Brasil torne-se um dos maiores produtores do mundo, com 20 milhões de toneladas de pescado por ano.

Agência Brasil